Rapunzel, jogue suas tranças!

Rapunzel. Fonte: Wikipedia

Rapunzel, a história da princesa de longos cabelos dourados aprisionada numa torre, é um conto de fadas que encanta gerações. A narrativa clássica, repleta de magia e aventura, estimula a pensar sobre mulheres que subjugam mulheres, rivalidade feminina e importância da liberdade. O conto dos irmãos Grimm é de 1815. No entanto, vale lembrar que a história de uma figura materna que aprisiona uma jovem numa torre já existia em diversas culturas europeias antes do registro dos irmãos Grimm.

Ao longo do tempo, a história sofreu várias adaptações e a versão mais popular é a dos estúdios Disney. Nela, num reino calmo e distante, a rainha adoeceu quando estava grávida. Então, para salvá-la, os súditos manipularam um elixir com uma flor cultivada a partir de uma gota de luz solar. O elixir restaurou a saúde da rainha e transferiu poderes mágicos e de cura para os cabelos da sua bebê. 

O rapto e a torre

Ainda bebê, Rapunzel foi raptada por uma bruxa má que desejava manter-se jovem e bela para sempre. Desta forma, a menina foi mantida em cativeiro numa torre e ali cresceu sem conhecer o mundo externo, com todos os seus desafios e belezas. E aí, a menina não conhecia nada além da vista da sua janela.

Por sua vez, a bruxa, mãe Gothel, sempre lhe dizia sobre o quanto as pessoas eram más e violentas, alimentando o medo e minando o desejo da menina em conhecer o mundo.

Ao longe e uma vez ao ano, Rapunzel encantava-se com as lanternas luminosas que subiam aos céus. Ela não fazia ideia que aquele espetáculo era promovido por seus pais, em sua homenagem, sempre na data do seu aniversário.

Nina assistiu Rapunzel repetidas vezes nos primeiros dias de isolamento em razão da pandemia de Covid-19, quando tinha 3 anos. Reproduzimos a história com direito a torre e tranças improvisadas.

Rapunzel conhece Flynn e o mundo 

Um dia, por acidente, um rapaz fugitivo entrou na torre. Flynn procurava abrigo porque havia roubado jóias da Coroa e precisava de um esconderijo para se safar da prisão. Ao ver o rapaz, Rapunzel reagiu com medo, golpeou e prendeu o invasor num armário. Depois que ele recobrou a consciência, ela o convenceu a acompanhá-la até o reino para ver o espetáculo das lanternas luminosas. 

Então, da torre ao chão, tudo era novo e Rapunzel se deslumbrou. Logo, os dois viveram intensas aventuras despistando aqueles que perseguiam Flynn, até que Gothel descobriu a fuga e foi atrás da moça. Ao encontrar os jovens, Gothel persuadiu Rapunzel para retornar para torre com ela. A bruxa difamou o jovem e tocou em pontos sensíveis e vulneráveis da jovem. 

Obsessão por beleza e rivalidade feminina

Além de um conto de fadas clássico, a história de Rapunzel, serve como um espelho para analisar relações de poder entre mulheres, a busca obsessiva pela beleza e a luta pela autonomia feminina. Gothel considera a menina como uma fonte de beleza e juventude e essa é a sua motivação para o sequestro. Por isso, ela não mede esforços ao trancafiar a menina na torre e enrredá-la numa teia de mentiras. Por meio da manipulação e do isolamento, tenta controlar Rapunzel e manter sua própria jovialidade.

A propósito, o conto foi publicado num período em que as concepções em torno de padrões de beleza eram marcados pela cintura apertada por espartilhos e palidez estavam se projetando.  

Padrões de beleza e autoestima feminina

É consenso que padrões de beleza, que muitas das vezes não correspondem com a realidade dos corpos femininos, exercem uma pressão significativa sobre a autoestima das mulheres. De tal forma que a constante exposição a imagens perfeitas e inalcançáveis, veiculadas pela mídia e pela indústria da beleza, cria um ideal de beleza imporvável de ser atingido.

Neste sentido, a busca incessante pela perfeição física pode levar a uma insatisfação crônica com o próprio corpo. Tal busca estimula problemas como baixa autoestima, transtornos alimentares e ansiedade. Além disso, a internalização desses padrões limita as mulheres a um único ideal de beleza, restringindo sua expressão individual e autenticidade. Assim, ao se sentirem inadequadas e pressionadas a se conformar a um padrão estético, as mulheres vêm sua autonomia e empoderamento comprometidos. 

Portanto, o drama de Gothel evidencia que os padrões de beleza e a busca feminina por se adequar a eles é uma construção histórica. Aliás, Gothel não é a única no cenário dos contos de fadas. A Rainha Má, de A Branca de Neve, e Úrsula, de A Pequena Sereia, também têm atitudes extremas motivadas pela busca da beleza.

Rapunzel não era mais a mesma

Mas, quando Rapunzel retornou à Torre, ela já não era a mesma e aquele lugar já não lhe pertencia. Por mais que Gothel tentasse mantê-la presa, Rapunzel estava livre de medos e das amarras daquele cativeiro. Depois de uma disputa, Rapunzel conseguiu vencer Gothel, salvou Flynn da morte e reencontrou sua verdadeira família.

Assim, Rapunzel não esperou autorização de Gothel para sair da torre. Da mesma forma, também não contou com Flynn para salvá-la. Rapunzel deixou transbordar sua curiosidade e se lançou para protagonizar a própria história.

Em resumo, a história de Rapunzel é uma narrativa que permite pensar a respeito da busca por encaixe em padrões de beleza e jovialidade eterna e inatingíveis. Ao mesmo, o conto mostra sobre a força subversiva feminina em busca por liberdade. Em outras palavras, Rapunzel assumiu o protagonismo da própria história.
Paralisar na torre? Não, jogue suas tranças também!
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